Paulo Cordeiro Salgado

Josete Fernandes - a propósito da sua exposição de pintura em Bragança

Cedães, uma aldeia do concelho de Mirandela. Um pormenor: uma casa na Rua da Igreja, sobranceira à ribeira que corre em baixo. Passei lá há dias: o tempo tem sido rude e a ribeira vai seca! (o tempo há-de esturricar-nos a todos...). Fomos recebidos pela terceira vez, a minha mulher e eu, pelo casal Josete e Miguel. Bebido um copo de água fresca na varanda, descemos ao piso inferior, onde está instalado o atelier de Josete Fernandes. Naquela divisão da casa, respira-se a frescura do ambiente, misturada com as tonalidades frescas dos trabalhos da pintora.


O Erro de Descartes e o pastor – de novo, as emoções

Desce as arribas do Sabor, agarrado ao seu pau, liso, gasto de décadas, uma bela vara de olmo, as ovelhas pastando aqui e ali, metediças, a espreitar a erva do terreno vizinho – é sempre assim, até os animais têm estes gostos. Ele, o meu amigo pastor, lança a pedra com perícia e afasta os seus animais.
- Põem-se doudas quando miram a erva noutras partes; cá pra mim, elas têm quereres que às vezes fazem lembrar algumas pessoas que gostam de ter o que não lhes pertence – atirou-me, quando me aproximava, chegando à sua fala.


O mundo das emoções

Quando escutamos os grandes fados de Amália ou de Carlos do Carmo; quando lemos uma obra de Torga ou de Mia Couto ou de Eugénio de Andrade; quando olhamos as pintura de Nadir Afonso ou de Graça Morais ou de Josete Fernandes; quando apreciamos uma calçada portuguesa desenhada por um canteiro ou um ajardinamento floral recortado algures por algum perito nesta arte; quando nos sentamos diante da obra de mestre Afonso Domingues que traçou o Mosteiro da Batalha; quando descemos os socalcos do Côa para apreciar as pinturas rupestres – ficamos extasiados, emocionados.


Uma história verdadeira

Olossato, tabanca (aldeia) e aquartelamento da tropa portuguesa. Guiné, 1970, algures no centro do território. Animata é nome de mulher fula - uma das várias etnias guineenses. Senhora com cerca de 40 anos. Um dos filhos alistou-se no movimento libertador; outro permaneceu na tabanca controlada pelo Exército Português, alistando-se nas fileiras da tropa colonizadora. Como se sentiria esta mulher, perante um ataque ao aquartelamento? Um filho, eventualmente atacando as nossas tropas, outro, defendendo-as, em nome da pátria portuguesa…!


O escritor Campos Monteiro – uma revisitação

Reli aspetos da obra “Cultura – Tudo o que é preciso saber”, de Dietrich Schwanitz, ensaísta alemão (1940). O título parece-me excessivo, como se fosse possível envolver “tudo sobre cultura”, porque o fenómeno cultural é multivariado, popular ou erudito. Schwanitz faz uma viagem por diversos fenómenos da cultura europeia, por vezes muito documentado, outras com pincelando, outras esquecendo os contributos de portugueses que ousaram conhecer e espalhar culturas pelo Mundo. Não há despeito, mas, geralmente, somos esquecidos pela grandiloquência dos grandes nomes.


Belicismo

Delenda est Cartago (é preciso destruir Cartago) - a célebre frase de Catão, o Velho, que terminou a sua vida pública como “censor” (o grau mais elevado da hierarquia política romana (234 – 149 a.C). Catão defendia o aniquilamento da florescente cidade-estado Cartago, destruída no final da terceira guerra púnica. A rivalidade entre Roma e Cartago, como bem recordamos, derivava do desejo de dominar o Mediterrâneo. O poder, sempre o poder.


Sociedade e distopia II

O nosso desespero, face às circunstâncias que afetam a sociedade de hoje, é motivado pela existência quase permanente de guerras e suas misérias humanas, apenas parcialmente minoradas pela solidariedade de alguns estados, instituições e pessoas. Atrevo-me a lembrar o que escreveu o filósofo inglês Thomas More (séc. XVI) (guilhotinado por não concordar com Henrique VIII que se transformou no chefe da igreja anglicana) na obra “Utopia”, falando acerca de guerras com o seu interlocutor Rafael: «Consideremos o que se passa dia a dia em volta de nós.


Sociedade e distopia I

1. Estamos perante uma guerra, cujos contornos e natureza não me atrevo a qualificar. Servindo-me de repórteres no terreno, de comentadores com conhecimentos sobre guerra, designadamente militares, estarei tentado a afirmar simplesmente que há uma invasão de um país por outro, por razões da chamada “geoestratégia política” – tese de que me confesso adversário.


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