A opinião de ...

O esbanjamento do capital humano

O último relatório da Fundação José Neves «Estado da Nação, Emprego e Competências em Portugal» confirmou o que suspeitávamos: a cada vez maior desvalorização do valor formativo, do valor económico e do valor como instrumento de procura de emprego das licenciaturas e outros cursos do ensino superior face a cursos de nível secundário. Concretizando, em 2011, uma licenciatura rendia mais 51% de salário do que o ensino secundário, e, em 2021, só vale mais 27%.
Esta tendência de abaixamento ocorre desde há 50 anos, com o início do Movimento Neoliberal e da terceira vaga, em economia, reclamando formações cada vez mais ligadas ao trabalho na empresa e à formação para o posto de trabalho, em empresas caracterizadas por uma forte componente de inovação tecnológica.
Só que o próprio movimento liberal foi ultrapassado pela rápida evolução da robotização e da automação, aliadas ao percurso rápido das tecnologias de informação e comunicação.
Além disso, o ritmo diferenciado da procura do «capital humano», baseada na ideologia de que a educação é a base da autonomia individual e do progresso dos povos, ritmo diferenciado de país para país conforme o ritmo de democratização e de modernização tecnológica e industrial dos países, foi aumentando a disponibilidade de mão-de-obra qualificada pelas universidades, em movimentos de incremento que corresponderam a uma cada vez maior massificação do ensino superior, no sentido em que deixou de ser um ensino de elites para passar a ser um ensino de massas inundando os mercados com uma oferta excessiva de mão-de-obra certificada mas não suficientemente qualificada para as exigências das economias e mercados actuais.
Saliente-se que por mais moderna que seja a escola, ela estará sempre atrasada em relação ao movimento da sociedade e das economias porque a escola tem de apreender os processos e reproduzi-los e, de preferência, recriá-los, gerando, neste caso, excelência.
O ato iniciador do último movimento de massificação foi a aprovação da Declaração de Bolonha, em 1996, criando condições para a equivalência entre cursos da mesma área e condições para uma forte mobilidade laboral no espaço europeu e não só.
De modo que o mercado foi inundado por licenciados, aumentando a procura de emprego e criando condições para o abaixamento salarial face à enorme procura de emprego. Porque, quando as «laranjas» abundam, o seu preço baixa.
Sempre escrevi que era este o espírito da Declaração de Bolonha mas fui sempre interpretado como elemento da teoria sócio-crítica que só vê efeitos negativos nas mais belas intenções como se uma das principais obrigações do legislador não fosse testar os efeitos perversos das suas leis.
De modo que, com Bolonha, baixou: 1) o nível das formações pois a maior parte dos cursos de mestrado passou de 7/8 anos para 4/5 e as licenciaturas de 5 para 3 ou 4 anos; 2) baixou o investimento das famílias na educação dos filhos porque passaram a pagar menos anos de propinas; 3) e baixou o nível de investimento do Estado em educação, desviando recursos para outras áreas. Mas aumentou imenso a disponibilidade de mão-de obra qualificada que, à míngua de emprego no seu país, demanda outros países.
Se a isto acrescentarmos as sucessivas crises económicas que, nestes 50 anos, fizeram transformar a economia e o emprego, temos um efeito explosivo que conduziu à proletarização dos licenciados. Urge então aumentar a qualidade, a duração e a exigência do ensino superior e reorientá-lo para tarefas mais específicas que não são realizáveis com cursos generalistas que servem para p

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