A opinião de ...

Para cá do Marão, sobrevivem os que cá estão

Ficou famosa, há uns anos, a expressão “Para lá do Marão, mandam os que lá estão”.
Um ditado que expressava o isolamento a que a região de Trás-os-Montes foi votada durante séculos, muitas vezes quase esquecida pelo resto do país.
O progresso que se materializou na construção de autoestradas e do túnel que atravessou o coração da serra veio pôr alguma água nessa fervura, que forja o nervo dos que por cá estão.
Um estudo de um investigador da Universidade da Beira Interior (ver páginas anteriores), deixa antever dificuldades acrescidas e crescentes para o dia a dia dos que insistem em mandar em si próprios.
O distrito de Bragança, juntamente com o de Vila Real ou o de Portalegre, por exemplo, é dos mais afetado pelo chamado “deserto noticioso”, um território mais ou menos demarcado no mapa de concelhos que não têm nenhum órgão de comunicação social ali sediado.
A alternativa, para estas populações, vem de jornais mais abrangentes, como o Mensageiro de Bragança, que tem uma cobertura distrital, não se cingindo apenas ao concelho onde está sediado (Bragança).
À primeira vista, os mais distraídos até podem achar que isso é apenas mais uma consequência do progresso, o mesmo que veio aplacar o isolamento dos que cá estão, para cá do Marão.
No entanto, um olhar mais atento e aprofundado, deixa espreitar algumas dificuldades, crescentes, para a própria democracia.
É que um terço dos 50 concelhos em que a abstenção é mais significativa, integram este chamado “deserto noticioso”.
Isto é, nos concelhos onde a presença da comunicação social não é tão forte, o desinteresse pela causa pública, a começar pelo ato de cidadania de exercer o direito de voto - ainda é um direito, não um dever - está a crescer.
Ora, o direito à informação está consignado na Constituição Portuguesa, a Lei fundamental que rege a vida no nosso país.
Sendo um direito, parece certo - até para o investigador responsável por este estudo - que há cidadãos mais iguais do que outros, como dizia George Orwell, no livro ‘O triunfo dos porcos’.
Num país livro e numa sociedade democrática, os direitos não olham a carteiras, a bilhetes de identidade nem a locais de residência. Existem para todos e para serem exercidos por todos, sem exceção.
O direito à informação é um deles. E, se não pode ser exercido por todos, há que encontrar uma solução, rapidamente, para repor a justiça e a igualdade. Sob pena de começarmos a encarar com uma normalidade pouco saudável o fim de direitos que a tantos custou a conquistar. Nós, pelo menos, vamos tentando lutar.

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