A opinião de ...

Futebolândia

Passada a pueril paixão assolapada pelo futebol, que como desafortunadamente sei provoca desvarios e desilusões, procurei perceber o fenómeno da irracionalidade dessa paixão no respeitante ao desporto-rei enquadrado no conceito de alienação tão caro a, filósofos, sociólogos, historiadores do talante de Johan Huizinga, George Simmel, Norbert Elias e Roger Caillois, cito estas importantes figuras do pensamento Ocidental na justa medida de as suas obras me terem possibilitado aceder a um maior e mais distinto entendimento dos pressupostos emocionais das paixões assolapadas que tantas vezes acabam em tragédias mortais e/ou jamais esquecidas pelas vítimas que as guardam na gaveta da memória dos acontecimento dolorosos.
A experiência e os exemplos colhidos fruto dessa mesma experiência couraçaram-me a pele e causticaram-me o ânimo, daí o fenómeno global do futebol passou-me a interessar no campo dos porquês: porque pessoas cultas, civilizadas e educadas «perdem» a cabeça na defesa do seu clube ao ponto de entrarem na berraria, no insulto soez, no descarregar nos árbitros iras e fúrias? Por que razão pessoas incapazes de soltarem um palavrão no seu dia-a-dia, despejam sacos e cestos dos mais vis num estádio de futebol? Por que homens e mulheres dotadas de valores da honradez e dignidade aceitam coabitar e comparticipar na gestão fraudulenta de clubes arrastando na lama os seus nomes e apelidos granjeando escrófulas para toda a vida e dos seus descendentes?
As interrogações e semelhantes têm suscitado trabalhos académicos e técnicos de profissionais do futebol, recordo Jorge Valdano e, no que tange ao descontrolo das claques e falanges de apoio recordo a ainda actual obra Psicologia das Multidões do autor oitocentista Gustave Le Bom.
Apagado militante benfiquista (nada mais), acompanhei do ora falhado propósito de revalidar o triunfo da selecção nacional no campeonato europeu. Propósito falhado. Segundo próceres políticos e a colmeias de comentadores e do seleccionador, Portugal jogou bem, mas a malvada sorte nada quis connosco e o «abono de família Ronaldo» estava em dia não. Um político português do Estado Novo não se cansava de na sua voz de cana rachada de dizer: a sorte dá um trabalho dos Diabos!
Nos próximos dias a lamúria do desaire vai ocupar noticiários e todo o género de análises de doutorados pé na bola, depois…depois compram-se fatiotas novas, a Dona Dolores do Funchal, qual oráculo de Delfos «botará falança», virá ao de cima a sentença do Senhor de Lampedusa. Façam o favor de a lerem.
Armando Fernandes

Edição
3839

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