A opinião de ...

A água, o capote e as sacudidelas

O caso envolvendo a nova (e, passado um dia, antiga) Secretária de Estado da Agricultura, deu ao Primeiro-Ministro a ideia peregrina de criar uma entidade, mais uma, que ficaria responsável por afzer o crivo das nomeações para o Governo.
O Presidente Marcelo, vendo, aqui, uma tentativa de o nosso Primeiro sacudir a água do capote, rapidamente chutou a medida para canto.
Mas António Costa não desistiu e, numa lógica de pressão alta a toda a largura do campo, enviou mesmo uma carta a Marcelo com os contornos da proposta e tem desdobrado aliados da medida em comentários pelas TVs.
Esta iniciativa faz-me lembrar aquele subsídio pago aos maquinistas da Carris por se apresentarem ao trabalho. Do meu ponto de vista, todos os trabalhadores o recebem e chama-se ‘salário’. Só naquela empresa é que, para além do salário normal que se recebe por trabalhar, ainda se leva para casa um subsídio por se ter apresentado ao serviço.
Quando um Governo é eleito, recebe um mandato da maioria da população para governar em seu nome.
Por impossibilidade de um país ser governado, em conjunto, por cada um dos seus cidadãos, estes conferem, através do voto expresso nas urnas, uma espécie de procuração a um punhado de eleitos para exercerem, em seu nome, o governo da coisa pública.
No âmbito dessas funções está a constituição do Governo, distribuindo várias áreas consideradas de maior importância por um conjunto de auxiliares (Ministros e Secretários de Estado), escolhidos por aquele que foi mandatado pelo Povo para governar em seu nome.
Ora, essa tarefa decorre do ato eleitoral e da confiança expressa pela maioria da população nas urnas num determinado candidato, já com a premissa de que ele vai, em seu nome, constituir a equipa que dirige os destinos de uma nação.
Para além disso, os partidos são máquinas organizadas, sobretudo os do chamado arco da governação, com estruturas locais de âmbito distrital e concelhio.
Portanto, criar uma estrutura especificamente para servir de recrutador dos governos, para além de redundante com as tarefas de quem foi eleito para o fazer, acaba por burocratizar ainda mais a máquina do poder mas, acima de tudo, desresponsabilizar quem foi eleito.
Como já dizia aquele filósofo cinematográfico que ficou famoso (o tio do Homem Aranha), “com grande poder, vem grande responsabilidade”.
E nunca é agradável à vista ver um político a querer sacudir a água do capote. Se não se sente capaz de Governar e de fazer as escolhas inerentes à tarefa para a qual foi eleito (e com maioria absoluta), não devia ter-se apresentado a eleições.
Governar é isso, fazer escolhas e assumir a responsabilidade por elas. Custe o que custar.

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