A opinião de ...

Sinais exteriores de riqueza

Sónia Sanfona, Presidente da Câmara de Alpiarça, depois de Ricardos Leão, o seu colega de Loures, veio, de novo, colocar à prova, a resistência e integridade das convicções políticas e fidelidade aos ideais políticos e sociais do Partido Socialista. A autarca propôs a exclusão dos apoios municipais todos os alunos cujo agregado familiar apresente sinais exteriores de riqueza… embora, em entrevista à SIC não tenha sido capaz de concretizar, de forma quantitativa a forma de avaliar esses sinais, remetendo-se para um vago “com critérios que eu determino!” explicando de seguida que ao dizer “eu” se referia à Câmara (curioso, no mínimo) para mais à frente exemplificar que tais serão aferidos pela observação de iPhones, nas mãos de um aluno, ser transportado num carro caro (de cinquenta ou sessenta mil euros) ou viver numa vivenda. Acrescenta que, obviamente, as crianças podem ter um telemóvel e, deduz-se, por analogia que, igualmente, poderão ser levadas e trazidas de carro para e da escola… dependendo do preço e da marca do veículo. Os camionistas terão de mandar os filhos a pé se quiserem ter direito a qualquer apoio.
A questão dos sinais exteriores de riqueza não é nova. Já há muito que falou dessa expressão do modo de vida dos cidadãos, mas não era (não foi, durante muito tempo) associada a qualquer subsídio escolar ou outro, mas como forma de combate à corrupção por parte de políticos e demais agentes públicos. E, como é do conhecimento geral, não só não houve qualquer acordo relativamente aos limiares definidores da riqueza mas, sobretudo nunca foi ultrapassada a questão constitucional da presunção de inocência e da inversão do ónus da prova. Ou seja, mesmo quando toda a gente vê que a declaração de rendimentos de determinado político com responsabilidades executivas, no governo um numa autarquia, não é compatível com a ostentação, quer seja pelo preço do carro em que se passeia, quer com a luxuosa vivenda onde mora (tal como acontece em Alpiarça, segundo o relato da presidente Sanfona) não há forma de afastar, punir ou reprimir a atividade do respetivo agente sem atropelar os direitos constitucionais dos respetivos cidadãos. E todas as tentativas para a sua criminalização foram goradas por não ser possível determinar com rigor a origem dos rendimentos efetivos que suportam tais modos de vida e ostentação. Nem a possibilidade de responsabilização pelo uso indevido de bens públicos e comuns, com penas, supostamente dissuasoras, impediram a proliferação do fenómeno que, à vista de todos, grassa por este nosso país, contrariando, na prática, um dos objetivos apontados por Sónia Sanfona para justificar a inserção de novos critérios, difusos e pouco objetivos e que, isso sim, poderão potenciar o discricionarismo, o caciquismo e a arbitrariedade.
Duvido que o regimento alpiarçano resolva a contento todas as “injustiças” na atribuição de apoios sociais, duvido menos que possa ser implementado de acordo com a excelsa opinião da líder autárquica mas não me custa nada a acreditar que, se o fosse e houvesse quem o gerisse, com mestria, poderia ter alguma “utilidade” adicional nos períodos eleitorais que se avizinham.

Edição
4016

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