A opinião de ...

A parada dos Espíritos

No passado dia 9 de maio, na Praça Vermelha, em Moscovo, realizou-se, mais uma vez, a impressionante parada militar demonstrativa do poderio bélico do exército vermelho, sucessor do temível braço armado soviético. A analogia com o segundo cavaleiro do Apocalipse, parece-me quase óbvia, começando pela cor e pelas atribuições:
“E saiu outro cavalo vermelho; ao que o montava foi dado o poder de tirar a paz na terra e fazer com que se matassem uns aos outros. E foi-lhe dada uma grande espada” Apocalipse 6:4.
A tribuna onde Putin detinha o lugar cimeiro e mais importante era ocupada por altos dirigentes militares fardados a rigor com as suas fatiotas de gala, todas de cor verde. O que, mantendo a alegoria, remete para o quarto dos apocalípticos cavalgantes:
“Olhei e vi um cavalo esverdeado; o que o montava tinha por nome Peste; seguia-o Hades. Foi-lhe dado o poder sobre a quarta parte da terra, para fazer perecer pela espada, pela fome, pela peste e pelas feras da terra” Apocalipse 6:8.
A parábola fica (quase) completa alguns capítulos mais adiante, quando são relatados os toques das trombetas bélicas:
“Tinham um tórax parecido com uma couraça de ferro, e o barulho das suas asas era parecido ao ruído dos carros de muitos cavalos, correndo para a guerra. Tinham caudas semelhantes às dos escorpiões, aguilhões nas caudas e o poder de torturar os homens durante cinco meses. Tinham por ri o Anjo do Abismo, que se chama em hebraico «Abaddon» e em grego «Apollyon»”. Apocalipse 9:9-11.
A quem, nos tempos que correm, assenta melhor o título de “Destruidor” do que o implacável, insensível e desumano habitante do Kremlin? Percorreu a parada, rodeado de uma parafernália de seguranças, fazendo-os transportar as malas de acesso aos botões nucleares, numa patética demonstração de fragilidade, querendo demonstrar ao mundo o seu enorme poder que, cada vez mais, se afirma na destruição de escolas, hospitais e residências, bem como na repetição de ameaças apocalípticas felizmente não concretizadas. Encheu, sem dúvida, a Praça Vermelha de carros de combate, de monstruosos mísseis e armas sofisticadas, bem como de correligionários em número suficiente, mas não se viu, como noutros tempos, “alma” nem arrebatamento. Sintomaticamente, este ano, não houve desfile de aviões ou outras aeronaves: o céu distanciou-se, prudentemente!

Noutra latitude, o espírito era a antítese do ambiente carregado e azedo de Moscovo. Ursula von der Leyen, muito menos terrena, sem ignorar os horrores da guerra e da resposta que é necessário dar-lhe, em vez de convocar soldados e blindados instou os espíritos, apelou às almas europeias e a todos os que prezam a paz, a democracia e o desenvolvimento... contrapondo o sonho europeu à sanha destruidora que sopra no leste. Não houve nenhum aparato impressionante, não soaram as trombetas bélicas, não se espalhou terror pelos assistentes e participantes... mas não houve, não há, nem pode haver quáquer dúvida que, por muito impressionante que tenha sido a parada militar oriental, a parada das almas, a união dos espíritos convocados pela Presidente da Comissão Europeia, foi, esmagadoramente, maior, mais efusiva, mais entusiasmante e que, portanto, levará a palma de prevalecer sobre os senhores da guerra, da devastação e da iniquidade.

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