A opinião de ...

A terça feira negra duma semana para não mais olvidar

A segunda semana deste mês de outubro, com particular acuidade na maneira como, aos mais diversos níveis, foi tratado o escandaloso número de casos de abuso de menores na igreja católica durante as últimas décadas, foi má demais para ser verdade.
É indiscutível que, sobre este escândalo hediondo e condenável, agora revelado em toda a sua gravidade, assim que, com toda a propriedade se pode dizer-se que só nunca errou quem nunca fez nada na vida, de igual modo, poder-se-á dizer também que ninguém, por mais impoluto e insuspeito que seja, está livre de ter um dia menos bom, daqueles dias em que nem à rua se devia sair.
Mas não foi assim e, pelas piores razões, a rábula ridícula em que envolveram, (ou, talvez melhor dizendo, em que se envolveram os mais altos dignitários da república), descambou para uma falta de nível e de dignidade tais, que acabou por levantar sérias dúvidas quanto à sinceridade, à oportunidade e às verdadeiras motivações do muito que sobre ela se disse, do muito que devia ter sido dito, e porque não também, do muito que nunca deveria ter saído da boca para fora de muita e boa gente, do que foram exemplo as intervenções infelizes do Primeiro Ministro, do Presidente da República e dum alto dignitário da Igreja Católica os quais, em função das altas responsabilidades que sobre eles impendem, desnecessariamente e por demérito próprio, acabaram por sair maltratados do olho do furacão e ficar muito mal na fotografia.
No que, concretamente, diz respeito ao envolvimento do Presidente da República em todo este imbróglio, conhecendo o seu currículo, tanto como professor político e jornalista, como agora o seu desempenho como Presidente da República, é tremendamente difícil encontrar qualquer justificação plausível ou mera explicação para o circo indecoroso e deprimente que, imprudentemente, ou talvez não, permitiu que se construísse à sua volta, indigno do seu passado e que, queira-se ou não, irá comprometer e condicionar negativamente o seu desempenho no que resta do seu mandato.
E que dizer da intervenção do Primeiro Ministro em todo este espetáculo? Muito pouco de quem, como prestidigitador emérito, num golpe de amizade sibilina, para “salvar” a face do amigo, não hesitou em tentar passar para o país a obrigação de pedir desculpa pelo crime que não cometera. Só que, azar o seu, o “criminoso” passou-lhe a perna, pedindo ele próprio desculpa antes que alguém lhe pedisse a ele.
Bem mais complexo e desconfortável, é o envolvimento da Igreja Católica portuguesa neste escandalo sem desculpa e sem perdão. Por agora, por manifesta falta de espaço, o mínimo que pode dizer-se do que está a acontecer-lhe, é que só pode queixar-se de si própria porque, como é evidente, foi ela própria que se pôs a jeito para que tal acontecesse.

Edição
3906

Assinaturas MDB