A opinião de ...

Pobreza e trabalho

Sempre que trago um tema para reflexão, a primeira dúvida que me ocorre é a de procurar que o meu entendimento dos conceitos que analiso seja idêntico ao dos leitores. As opiniões podem ser concordantes ou discordantes, mas escritor e leitor devem estar em sintonia no entendimento dos conceitos, caso contrário, a informação é pouco eficaz e pode transformar-se num ruído que em vez de enriquecer o entendimento social só o confunde e complica.
Ao falar de pobreza, surge de imediato a questão: O que os leitores entendem por pobreza? Para facilitar o entendimento recorri ao dicionário de sinónimos da Porto Editora, https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa, o qual apresenta, entre outros, como sinónimo de pobreza: “Qualidade ou estado de uma pessoa com falta de meios materiais”.
O conceito de pobreza não pode ser desligado das necessidades, dos objetivos e aspirações de cada ser humano, bem como do contexto onde vive. A falta de meios materiais também está associada à cultura e perspetivas de cada pessoa para viver em sociedade. Pensando na pirâmide de Maslow, enquanto uns lutam por criar condições para responder com sucesso às necessidades fisiológicas básicas, outros preocupam-se com necessidades de segurança, necessidades sociais, autoestima e autorrealização. Todas estas necessidades estão relacionadas, e não é fácil, senão mesmo impossível, lutar pela autoestima e pela autorrealização, enquanto as necessidades fisiológicas básicas não estiverem plenamente satisfeitas.
De acordo com o INE, a taxa de risco de pobreza em 2017 correspondeu à proporção de habitantes com rendimentos monetários líquidos inferiores a 468 euros por mês, admitindo-se, também, que está em risco de pobreza quem, após as transferências sociais, tais como abonos e subsídios, vive com rendimentos abaixo desse limiar. (/www.publico.pt/2018/11/30/sociedade). De acordo com o mesmo jornal tem diminuído de forma expressiva a pobreza infantil, mas no grupo dos desempregados e idosos não se têm registado grandes melhorias, acrescentando, ainda, que 45% dos que não têm emprego vivem com rendimentos abaixo do limiar de pobreza e que perto de 2,4 milhões de pessoas encontram-se em risco de pobreza ou exclusão social.
Num mundo capaz do pior e do melhor constata-se que há possibilidades reais para que em cada um dos países desenvolvidos, nos quais se inclui Portugal, não exista qualquer pessoa a viver em risco de pobreza, considerando-se pobre toda a pessoa que não possui meios para satisfazer as suas necessidades materiais.
Parece-me que o que está em causa são essencialmente opções políticas. Estas opções têm muito a ver com a forma como se valoriza o trabalho e se dignificam as pessoas que o realizam. É fundamental na atribuição de apoios sociais tratar de forma distinta as pessoas que têm condições físicas, psíquicas e enquadramento legal para o mundo do trabalho, das que não possuem tais condições.
Se por um lado se deve evitar que qualquer pessoa esteja abaixo do limiar da pobreza, por outro, é urgente diferenciar em termos de rendimentos os que trabalham dos que não trabalham. Não se justifica que exista mão de obra disponível para as necessidades do país e que existam pessoas que se recusem a trabalhar porque “fica-me mais ao fim do mês se não trabalhar e me mantiver com este, ou aquele, subsídio”.
É fundamental valorizar, dignificar e cultivar o gosto pelo trabalho e ver no trabalho um meio para diminuir a pobreza, assim como considerar os apoios sociais um recurso indispensável para a paz social, mas a utilizar apenas quando é necessário.

Edição
3709

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