Nordeste Transmontano

Socialistas exigem renovação na lista à Assembleia da República

Publicado por Glória Lopes em Qui, 2021-12-02 10:21

A lista socialista candidata à Assembleia da República, nas eleições legislativas de janeiro, deverá estar preparada até 10 de dezembro.  Esta é, pelo menos, a data definida a nível nacional para os processos estarem encerrados.  Tudo indica que Jorge Gomes, deputado na Assembleia da República, não será o cabeça de lista, numa altura em as próprias estruturas nacionais do partido pedem um ‘refrescamento’.  

Jorge Gomes não quis adiantar ao Mensageiro se integrará  rol de candidatos. “Não faço ideia. Também não era para ser candidato à Câmara de Bragança e fui”, referiu o deputado esclarecendo que a decisão de recandidatar-se pertence apenas a ele.

“Só esta semana serão definidos e entregues os critérios. Está tudo dependente dos critérios aprovados a nível nacional, que serão determinantes para as Distritais elaborarem  seu trabalho. No meu caso, ainda vou decidir”, referiu.

A nível local, há uma facção de militantes descontentes com o resultado das eleições autárquicas. O PS perdeu as Câmaras de Miranda do Douro, Mogadouro e Vila Flor, mas ganhou a de Freixo de Espada à Cinta. Muitos militantes exigem o  tal ‘refrescamento’ que o primeiro-ministro, António Costa, já disse querer fazer.

Jorge Gomes diz que apenas pede essa renovação “os que perderam na corrida à distrital, claro que pedem isso, para não serem os dos 70%”, acrescentando que quem pede mudança “é uma voz ou duas, a quem não dou crédito absolutamente nenhum”, acrescentou .  

No entanto, também ele preconiza a renovação. “Já nas últimas legislativas a lista integrou muita gente jovem”, acrescentou. Jorge Gomes reconhece o  mau resultado nas autárquicas. “Perdemos três câmaras, que não era suposto perder. A questão da pandemia mexeu muito com as pessoas e os autarcas estiveram muito próximos. Para uns isso valorizou, para outros não”, afirmou.

No PS local o mal-estar latente dos últimos anos está a passar a manifesto. Depois de o anterior presidente da Câmara de Miranda do Douro, Artur Nunes, autarca durante 12 anos, em entrevista ao Mensageiro ter admitido que ainda está a ponderar se vai continuar a ser militante do partido face ao descontentamento com a situação, o nosso jornal contactou dois antigos presidentes da Federação Distrital.

Ex-presidentes da distrital altamente críticos com a liderança atual

Mota Andrade, ex-líder da Federação e ex-deputado na Assembleia da República, tece duras críticas às estruturas partidárias distritais.

“O PS no distrito não tem uma bandeira, não tem uma ideia, não tem um interlocutor junto do poder central para reivindicar aquilo que os transmontanos precisam e que não tem existido ao longo dos últimos seis anos”, afirmou Mota Andrade, vincando que “não tem havido nenhuma intervenção, nem na Assembleia da República, nem junto o governo a reivindicar o que a região precisa”.

O antigo deputado pede mudança de protagonistas nestas eleições, sob pena de os resultados serem maus para o PS e piores para o distrito. “Espero que haja uma mudança total na lista a apresentar aos eleitores. Temo que isso não aconteça, o que será muito mau para o distrito. Em princípio essas indicações serão feitas por Lisboa, já lá vai o tempo em que Bragança tinha poder e suficiente força para indicar os seus representantes na Assembleia da República. Quando isso se perde, é evidente que o futuro será muito mau se não hou- ver uma mudança total”, acrescentou.

Mota Andrade lamenta ainda que “o partido não reúna e esteja parado, porque não tem uma ban-deira, nem luta por nada a não ser conservar-se no poder” .

A falta de reflexão interna após o resultado das autárquicas é outra pedra de toque. “Nos últimos quatro anos não aconteceu nenhum plenário distrital, onde os militantes pudessem expor as suas ideias, insatisfações ou satisfações. Os resultados nas autárquicas foram maus, o processo eleitoral em Bragança foi vergonhoso, e nem assim o PS reuniu. A direção distrital não tem pingo de vergonha, porque se tivesse não era preciso ser a direção nacional a tirar conclusões, ou seja, quem vai na próxima lista. Eram os próprios que se deviam ter demitido. É inacreditável como é que durante quatro anos há um deputado na Assembleia da República que não abriu a boca, nem lutou pelo distrito ”, acrescentou.

Carlos Guerra, outro ex-presidente da Federação e candidato derrotado à Câmara de Bragança há quatro anos, també vota na mudança nalista à AR e que se dê lugar aos novos, mas também que o partido assuma os maus resultados, através de uma análise aprofundada.

“O projeto atual teve quatro anos, sem oposição, nem objeções, mas mesmo assim conseguiu perder a maioria nas câmaras no distrito, a maioria de câmaras na CIM-Terras de Trás-os-Montes, as poucas juntas que o partido tinha no concelho de Bragança e votação para esta câmara. As derrotas têm que ser assumidas. Não se trata de um ajuste de contas, mas da necessidade de avaliar o que correu mal e porque é que correu mal e o que se deve fazer para corrigir”, observou. O ex-presidente da distrital diz que não se podem alimentar lideranças “de caudilho” porque significam sempre “maus momentos”, com tendência para se ter “receio dos quadros com mais valor, que se afastam e às vezes até criando problemas”. Guerra pede que se vire “a página geracional”.

Ainda assim, elogia o trabalho dos quatro secretários de Estado transmontanos no atual governo. “É um trabalho reconhecido em Lisboa e no país o dos secretários de Estado do PS ou simpatizantes do partido. São quadros valiosíssimos que qualquer partido gostaria de ter. Não quero acreditar que ter este manancial, mais o Artur Nunes (ex-autarca de Miranda do Douro), Fernando Barros (ex-autarca de Vila Flor), e outros ex-autarcas que têm muita experiência, não haja alternativa, não pode ser mais do mesmo. Espero que Jorge Gomes assuma o falhanço de um projeto”, referiu.

Pede ainda uma reunião plenária de militantes para refletir a situação do partido. “Em Bragança, nestes quatro anos conseguiram que houvesse três concelhias, o que não é plausível. Esta Federação teve quatro anos de tranquilidade para consolidar o seu projeto, mas foi uma soma de desaires, ressalvando a Câmara de Freixo de Espada à Cinta e de outras onde os autarcas conservaram o poder”, criticou, sem pedir a demissão de líder da Federação. “Devia ter chamado os militantes para discutir isto. Dois ou três dias depois de eu ter perdido a Câmara de Bragança estava a ser convocada uma reunião onde foi pedida a minha demissão, mas nessas Legislativas o PS teve a maioria das câmaras no distrito, o que não acontecia há 20 anos”, destacou.

Convicto que o partido tem bons quadros, lamenta que “alguns sejam marginalizados”.
Um dos dois vereadores socialistas
no executivo da Câmara de Bragança entre 2017-2021, Nuno Moreno, que não é militante do PS, pois concorreu como independente, sentiu-se desapoiado pelas estruturas locais durante esse mandato, apesar de ter assumido um lugar ativo na oposição.

Sobre a lista à AR, Moreno, que quando fala do partido se refere “a nós PS”, diz que se trata de um assunto “que tem que ser enquadrado a nível partidário, mas não significa que a comunidade não se pronuncie, nomeadamente os atores políticos”. Pela sua parte defende que o cabeça de lista por Bragança “devia ser reconhecido pelas qualidades pessoais, profissionais e políticas” e concorda com o primeiro-ministro na necessidade de “refrescar, em alguns distritos, nomeadamente algumas caras mais desgastadas e com mais idade”. Sobre a atual liderança da Federação considera que teve um mandato “tranquilo e sem oposição interna”.

Defende que agora falta fazer o balanço do resultado da atividadessa política. “A concelhia desde 2017 nunca funcionou nem internamente, nem externamente, porque pouco reunia para apresentar propostas e preparar o combate político, nem fez intervenção visível em prol do concelho. A única face visível do PS no concelho foram os representantes eleitos nos órgãos autárquicos no executivo camarário e na assembleia municipal. Trabalharam, mas nunca tiveram a retaguarda da concelhia. Pior do que isso o partido não só não apareceu, como foi uma força de bloqueio, nunca prestou apoio. Eu consegui fazer uma conferên- cia de imprensa a muito custo, por- que andei a pedir, quis fazer uma segunda. Primeiro disseram-me que sim e depois negaram. Agora quem dirige o partido localmente continua a fazer-se de morto, está fechado na sua concha. Funciona como um clube privado, quando precisa de se abrir, virar-se para Bragança e saber acolher os militantes e todos aqueles que querem trabalhar sem receber nada em troca ”, acrescentou Moreno. Jorge Gomes rejeita as críticas e diz que “esses militantes ficam em casa e não aparecem para trabalhar”, vincando: “ Eu nunca os vi”. A estrutura partidária para o combate eleitoral está montada e mobilizada. “Vamos organizar a lista. Vai ser aprovada ou não e começamos a preparar um ciclo novo. Depois serão as eleições para a Distrital, ainda não há calendário”. Não revela se será recandidato, mas “a opção está tomada”, afirmou.

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