Comemorações do cinquentenário do 25 de abril passaram pela vila e tiveram direito a uma homenagem
A revolução dos cravos não passou por Torre de Moncorvo mas teve o dedo das suas gentes. Por isso, era natural e justo que as comemorações do cinquentenário do 25 de abril também passassem pela terra do ferro.
Isso mesmo foi o que pensou Paulo Salgado, moncorvense de gema, quando pensou em comemorar esta data. Para isso, socorreu-se de alguns amigos e da esposa, que rapidamente alinharam no desiderato. A ideia era fazer uma sessão em 2020. Mas a pandemia veio trocar as voltas a toda a gente.
Três anos depois, eis que a ideia ganhou forma, agora sem um dos amigos de sempre, o jornalista e poeta Rogério Rodrigues, falecido em 2019. Sem a presença física deste filho da terra, foi tempo de uma homenagem, sentida, como sentida foi a presença “do Rogério” no anfiteatro moncorvense.
“Fomos os proponentes eu, a minha esposa [Maria da Conceição Salgado], o Capitão Mário Tomé e a quem se juntou a Câmara Municipal. Este programa era para ter sido levada a efeito em 2020, com uma preparação prévia em 2019. Esta comemoração do 25 de abril em 2020 teve a aquiescência do meu querido amigo Rogério Rodrigues, que entretanto faleceu.
Com estas comemorações em todo o país, entendemos ser a oportunidade de levar a cabo este evento, que já estava preparado, apenas com algumas alterações de forma a ser mais abrangente”, explicou Paulo Ramiro Salgado ao Mensageiro.
A estas comemorações juntou-se, entretanto, a Comissão Executiva das Comemorações Oficiais dos 50 anos do 25 de abril e a própria Associação 25 de abril.
O resultado foram “três dias de algo muito importante”, segundo o jornalista Adelino Gomes, um dos convidados.
“O que aconteceu aqui foi muito importante. Juntaram aqui pessoas para que houvesse aqui um menu cultural, político, económico e literário, suficientemente atrativo para as pessoas. E isso é muito bom.
Não é costume acontecer fora de Lisboa. Para mim foi uma surpresa. A qualidade deste programa... e era muito concreto. E muito variado”, sublinhou o antigo jornalista, que participou num momento especial, de homenagem a Rogério Rodrigues.
O antigo professor e jornalista, nascido em Peredo dos Castelhanos, a última aldeia do distrito de Bragança, foi quem deu a notícia, em Moncorvo, da revolução dos cravos. Dirigiu-se à Câmara e retirou os retratos oficiais que simbolizavam a ditadura, como contou Arlete Rodrigues, sua esposa.
Nuno Gonçalves, presidente da Câmara de Moncorvo, anunciou a decisão de atribuir o nome de Rogério Rodrigues a uma das ruas da vila.
“É uma rua que entronca com a sede do concelho e com a D. Dinis. É uma artéria que se desenvolveu agora, beneficiada com as intervenções do PARHU, a alguém que durante anos nos ensinou e me ensinou a lutar pela liberdade”, explicou, frisando que é uma forma de “reconhecer os que nos são próximos e que elevaram o nome de Torre de Moncorvo”. “E ele, enquanto jornalista, elevou o nome da vila”, disse Nuno Gonçalves ao Mensageiro.
“É importante que os jovens percebam por que é que se fez a revolução”
Entre os oradores convidados esteve Vasco Lourenço, um dos rostos da revolução. Ao Mensageiro, sublinha que é importante que os jovens conheçam a história, apesar de já darem a liberdade como adquirida.
“Que fiquem a conhecer o que aconteceu, porque é que aconteceu e como é que aconteceu. Mas, essencialmente, porque é que aconteceu.
A situação que havia antes do 25 de abril, de falta de liberdade. Eles [os jovens] hoje respiram liberdade como quem respira oxigénio. Nasceram em liberdade pelo que a questão da falta dela não se põe. Mas é preciso alertá-los que há sempre alguém a querer tirar a liberdade dos outros. Tem de haver coragem e uma permanente luta em defesa da liberdade. E isso é essencial para os jovens, e poderem comparar o que era Portugal antes e o que é depois. Compararem o que foi a guerra colonial e compararem os traumas que ainda hoje se mantêm para milhares de portugueses”, sublinhou.
Para além dos seis painéis temáticos, que contaram ainda com a participação de combatentes na guerra do Ultramar dos dois lados da barricada, assim como um concerto e uma peça de teatro.
“Tivemos as pessoas que fizeram história e que podem contar como a viveram. Filhos de combatentes, momentos com as escolas, brilhantes intervenções quer dos capitães de abril quer das mulheres, com um painel só de mulheres, o que não é muito comum, guerrilheiros do PAIGC, que combateram com militares portugueses, que ali se encontraram.
Todos chegaram a um acordo, que foi uma guerra sem sentido”, destacou Nuno Gonçalves.
Paulo Salgado também fez, por isso, um “balanço positivo, não obstante estarmos à espera que houvesse maior envolvimento das pessoas locais”. “Mas isso faz parte da democracia, na certeza de que se perdeu uma possibilidade única de termos entre nós grandes personalidades”, concluiu.