A opinião de ...

Sendim, concelho de Miranda do Douro (a minha primeira escola como professor)

No último fim-de-semana de Junho, como chuviscava, resolvi dar uma pequena volta pelo Planalto Mirandês, para sair um pouco da rotineira e fui até Miranda do Douro, cidade que eu tanto gosto. Fui pela IC5 até Miranda e, lá chegado, fui cortejar, como não podia deixar de ser, o “Menino Jesus da Cartolinha”. Feitas algumas compras e visitando esta cidade, resolvi voltar para Mogadouro, pelas estradas interiores e pelo caminho pensei: Porque não ir a Sendim, ver a minha primeira escola, como professor? Chegados a esta linda terra, logo deparei na sua escola, que foi a minha primeira escola como professor, já lá vão mais de quarenta anos (primeiro como professor de Português e no ano seguinte, já professor de História). Comecei aqui a minha “peregrinação” de professor (depois fui para a cidade de Beja, depois para a Sertã e finalmente em Torre de Moncorvo, até à minha aposentação, que começou oficialmente em 9 de setembro de 2021, mas sempre a lecionar História). Mas como é que lá fui parar? É uma história engraçada que quero partilhar convosco. Foi assim: findas as férias, fui tentar ficar a lecionar numa escola do litoral perto da minha terra, procurei, procurei…, mas não encontrei praticamente nenhum lugar para dar aulas, pelo que a minha esposa me disse: “Porque não procuras em Trás-os-Montes?”, Território para mim completamente desconhecido, ao que eu respondi: “Pois vamos lá para ver se lá encontro um lugar.”, e assim partimos para Mogadouro, terra natal da minha esposa. Uma vez aqui chegados, nova desilusão, pois aqui também eram muito raros os lugares para professores de História, até que alguém me disse, olha porque não vais a Sendim? pois é uma escola que já tem bastantes alunos. Lá fui eu, confesso que com poucas esperanças de lá encontrar um lugar para mim. Chegados lá, fui à Secretaria, cujo chefe era o Sr. Ferreira (se não me engano) e ele disse-me: “Olhe, temos um lugar vago, mas é para dar aulas de português, aos 5º e 6º anos”, ao que eu respondi: “Eu não me importo de lecionar português”, então vamos falar com o Sr. Presidente do Conselho Diretivo e lá fomos nós. Entrados no Conselho Diretivo, eis que se levanta o seu Presidente ao qual expusemos a nossa situação. O Sr. Presidente falou com o chefe da Secretaria e, no final disse-me, “sim podes ficar aqui a dar aulas”. Adorei estas palavras do Dr. António Oliveira Gonçalves Viana (creio que é assim o seu nome completo), pelo que o cumprimentei com muito agrado e vendo que se chamava Viana, disse-lhe: “Olhe eu sou natural do distrito de Viana do Castelo”, ao que ele me disse: “Chamo-me Viana e tenho raízes em Viana”, demos um abraço e lá assinei uns papéis para dar aulas em Sendim. Findo isto, o Sr. Dr. Viana perguntou-me se eu já conhecia Sendim, ao que eu respondi que não conhecia, então, venha daí dar uma volta para conhecer aterra, ao que eu respondi que o faria com todo o gosto. E lá fomos nós passear por Sendim, mas ao sair da Escola eis que entramos três idosas, todas vestidas de preto, creio que vinham de um médico, em que praticamente só se viam os olhos e que falavam uma língua que eu não percebi absolutamente NADA! Então virei-me para o Dr. Viana e, assustado disse-lhe: “Ó Dr. Viana, se as netas destas Senhoras falarem como elas, as minhas aulas só poderão ser dadas por linguagem gestual”, riu-se e disse-me: “não Castro, as netas destas Senhoras falam o “Português fidalgo”. Eu, sem nada saber perguntei-lhe: “mas o que é o português fidalgo?”, ao que ele me esclareceu: “É o português que se ensina na escola”. Suspirei de alívio e soube que, naquele tempo o “mirandês”, ou com mais precisão, o “sendinês” era uma linguagem muito ameaçada e quase apenas oral e rural. Hoje o “mirandês” e o “sendinês”, estão salvos, mercê da obra e do trabalho do meu saudoso amigo Amadeu Ferreira e da “Associaçon De La Léngua I Cultura Mirandesa (A L C M)”, da qual sou sócio (nº 52), com todo o prazer. Aqui eu aprendi muito. Resumindo: foram dois anos extraordinários em que tive alunos maravilhosos, trabalhadores que nunca me causaram problemas. Sei, que muitos deles estão muito bem na vida, o que me dá uma grande alegria. Saudades e o melhor para todos eles.

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3993

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