A opinião de ...

A mesa bem servida

Quando vires uma mesa bem servida de comida, lembra-te de que há milhões de pessoas que nem mesa têm.
Tomando esta afirmação como certa, repare-se que há, na sociedade em que vivemos, uma grande injustiça movida pela disparidade entre os que tudo têm e os que nada têm. Esta constatação tem vindo a repetir-se, de dia para dia e de ano para ano, sem que tal situação revele tendência a desaparecer.
Vários são os motivos por que tal acontece, não sendo despiciendos, tanto o egoísmo como a falta de solidariedade, os quais muitas vezes não podemos deixar de considerar dependentes de decisões políticas.
Enquanto, como penso, o aumento da população é inversamente proporcional à produção alimentar, mesmo assim a maior parte desta produção continua a pertencer a poucos, em detrimento dos muitos que precisam, ao menos, do pão de cada dia.
Quantas vezes a Comunicação Social nos dá conta da fome e da angústia visíveis, por esse mundo fora, nos corpos subnutridos de gente que nem sabe como e quando comeu nem como e quando poderá voltar a comer!
Ficam-nos na memória, sobretudo as crianças subalimentadas, descalças e andrajosas, sujeitas a todas as doenças, apesar das organizações vocacionadas para dar-lhes assistência procurarem heroica e constantemente, se não debelar, pelo menos amenizar tanta miséria!
É pois, neste mundo de desigualdades, que há mesas em que nada falta; e que, depois de satisfazerem a necessidade e, quantas vezes, o prazer e a gula dos que se sentam à sua volta, se encarregam de mandar deitar no lixo o muito que sobra – esse muito que poderia matar a fome a quantos nem mesa têm.
Perante esta situação, como poderá conter-se a fúria da multidão que precisa de comer? Que respondam os que se sentem ameaçados, porque a criatividade acontece a todo o momento e em todo o lado.
Sempre que o Governo dum país deixa de cuidar do seu povo – o povo que sobrevive esfomeado – deixa de cumprir a obrigação para que foi mandatado; e então, não pode admirar-se de que haja roubos, assassínios, reivindicações, protestos, greves e, no limite, revoluções.
Perante este quadro, não é de admirar que surjam a instabilidade e a dificuldade em governar. São proferidos avisos, é debitada legislação e, por fim, é empregada a força.
E para que servem as cadeias?
É nesta altura que alguém se lembra desta ameaça: para uns uma solução imediata; para outros a privação da liberdade. E a insurreição há de continuar a agravar-se: é notório que a força do vento não consegue fazer despir o casaco ao viajante; mas o brilho do sol, esse sim, consegue.
Se a política daquele Governo tiver como objetivo fazer vergar, pela exaustão, a população que o incomoda ou, até deliberadamente, não querer alimentá-la, será fácil constatar que as desigualdades, progressivamente a aumentar, vão criar-lhe cada vez mais e maiores problemas.
Mesmo assim, prevalecerão a injustiça, a instabilidade e o sofrimento, como consequência do egoísmo e da falta de solidariedade que este mundo persiste em valorizar.

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