A ética já não é o que era
“Quereremos o esclarecimento total, total, à volta do que tem vindo a público e que é, de facto, estranho e que nos lança para a necessidade de os cidadãos ficarem tranquilizados com os esclarecimentos que são dados.”
As palavras são do líder da oposição e referem-se a um imbróglio que envolveu um governante. Alguém consegue descortinar, pelas palavras ditas, de quem se fala?
“Face à falta de explicação, a situação é de molde a retirar-lhe a plenitude da sua capacidade de exercer, com toda a autoridade, a função de membro do Governo”, continuou o mesmo líder da oposição.
“Eu sei o que faria se fosse primeiro-ministro. Não faria o mesmo”, disse, na altura.
O seu a seu dono.
O líder da oposição que proferiu tão certeiras palavras chama-se Luís Montenegro e clamava, assim, por uma ação do então Primeiro-Ministro, António Costa. Corria o ano de 2022 e o visado era o Secretário de Estado Adjunto do PM, Miguel Alves, ex-presidente da Câmara de Caminha, a propósito de uma acusação, de que veio a ser ilibado.
Quem tem telhados de vidro não devia brincar com as pedras.
Nem três anos depois, as pedrinhas que Luís Montenegro foi arremessando, vieram agora todas devolvidas por fisgas bem calibradas, dirigidas certeiramente aos seus telhados de vidro, que são muitos.
A ética e a moralidade que então clamava ficam, agora, metidas na gaveta, bem escondidas, porventura debaixo dos esclarecimentos que deveria prestar ao país mas dos quais se furta.
Até o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sempre tão solícito a comentar a atualidade, tem ficado num silêncio ensurdecedor, que diz mais do que muito discursos.
Convém não esquecer que o anterior Primeiro-Ministro se demitiu mal soube que estava a ser investigado pela Procuradoria Geral da República, num caso que não conheceu mais desenvolvimentos desde então a não ser as escutas que foram conhecidas e em que o António Costa de que se falava era Ministro, mas da Economia e não o Primeiro.
Agora, o mesmo Montenegro que atirava pedras em nome da ética e da moralidade está a ser investigado pela Procuradoria Geral da República por suspeita de ilegalidade no exercício de funções exclusivas, bem como pela Ordem dos Advogados por suspeita de Procuradoria Ilícita.
Mas a ética e a moralidade que Luís Montenegro clamava para os outros, a ‘imprudência’ que apontou a Hernâni Dias e que levou à sua demissão do Governo, foi agora atirada às malvas...
O passar agora a empresa para os filhos é o assumir de que ao longo deste ano esteve em situação indevida. Mas e as consequências?
Assim vai a ética e a moralidade na política.
A queda deste Governo é inevitável. Luís Montenegro será dos poucos que ainda não o aceitou. Até no PSD já se fala no substituto...