A violência contra os pais. Um reflexo preocupante da sociedade atual
Três notícias muito recentes vêm chamar a nossa atenção para um tipo específico de violência doméstica de enorme gravidade, de uma forma aterradora. Ficamos todos tão mal nesta fotografia! O Estado, as famílias, todas instituições e cada um de nós enquanto cidadãos.
A primeira é uma informação sobre estatística da APAV, com o título: “Filhos/as que agridem os pais/as mães – 2022/2024”, (https://apav.pt/estatisticas-apav-filhos-as-que-agridem-os-pais-as-maes…). Na introdução informa que, nestes 3 anos, apoiou 2.813 pais e mães vítimas de violência praticada pelos filhos ou filhas. Acrescenta que “este número traduz uma realidade particularmente sensível da violência intrafamiliar frequentemente associada ao envelhecimento da população e à dependência entre gerações”. A segunda notícia titula “José Manuel Anes esfaqueado em casa. Filha detida pela PJ” (Público online, 20OUT, 20:51). A terceira, do JN online, no dia 21OUT, às 18:26: “Vereadora da Câmara de Vagos assassinada em casa na Vagueira”. Todas tiveram enorme repercussão nos media. E agora?
A OMS define violência como “O uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou comunidade, que resulte ou tenha grande probabilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, mau desenvolvimento ou privação.” Esta definição vai além da agressão física. Inclui também o abuso emocional, a negligência, a coação e a violência psicológiaca, todas formas que ferem a integridade e a dignidade humana.
A violência doméstica é, muitas vezes, associada a agressões de adultos contra crianças, mulheres ou idosos. No entanto, o fenómeno da violência filial é cada vez mais visível e alarmante. Quando os filhos agridem física, verbal ou psicologicamente os pais, especialmente as mães. Este tipo de violência, embora menos discutido publicamente, tem crescido de forma muito significativa, como revela a informação divulgada pela APAV, e demonstra as fragilidades nas relações familiares e sociais.
Quando um filho agride um dos pais, rompe-se o vínculo fundamental de respeito e cuidado que sustenta a convivência familiar. As causas são múltiplas: fragilização dos laços afetivos, ausência de limites na educação, consumo de substâncias psicoativas, abuso na utilização das redes sociais, problemas de saúde mental ou, ainda, padrões de comportamento aprendidos em contextos violentos. Em muitos casos, os agressores são jovens ou adultos dependentes economicamente, o que cria um ciclo de tensão e submissão dentro do próprio lar.
Em termos sociais, a violência dos filhos contra os pais reflete uma crise mais ampla de valores e de estrutura familiar. Mostra o enfraquecimento das redes de apoio e a dificuldade de lidar com frustrações e autoridade. Além disso, muitos pais, movidos pela vergonha ou pela culpa, silenciam o problema, o que impede o acesso à ajuda e à intervenção adequada, enquanto é tempo.
Este tipo de violência não pode continuar a ser visto como um drama privado, mas sim como um problema social urgente. O Estado deve agir com políticas públicas eficazes de prevenção, apoio psicológico e proteção às vítimas. As instituições escolares, de saúde e de justiça precisam estar articuladas e preparadas para identificar e intervir precocemente. E cada cidadão tem o dever de romper o silêncio e denunciar. Ignorar esta realidade é ser cúmplice de uma sociedade que permite que o lar, lugar de amor, de segurança e felicidade, se transforme num campo de medo e destruição.
