A opinião de ...

A importância da pergunta

Andei vários anos a ouvir exatamente isto: – Zé Mário, o importante é a pergunta! Para uma pergunta boa haverá, seguramente, uma boa resposta. Com mais ou menos dificuldade, com mais ou menos esforço, com trabalho, empenho e persistência a pergunta certa terá a resposta adequada. Para isso, algumas vezes  será necessário também muita qualidade e algum golpe de asa. Mas, o verdadeiro busílis o que requer génio, capacidade inventiva, olhar crítico, espírito inovador é a pergunta!
De tanto o ouvir interiorizei-o de tal forma que acabou por me parecer natural, lógico e evidente. Mas a recente descoberta do investigador João Taborda Barata do Instituto de Medicina Molecular em colaboração com o Instituto Gulbenkian de Ciência e outras instituições internacionais de investigação veio demonstrá-lo de forma viva e clara. Foi a pergunta que possibilitou o caminho que o João Taborda e a Leonor Morais Sarmento, entre outros, percorreram para chegar à solução “miraculosa” de combate à leucemia linfoblastica aguda.
Vejamos: Sérgio Dias, um reputado investigador do IPO há vários anos, em Vila Flor explicou com clareza e simplicidade para os inúmeros alunos da Escola Secundária que o escutavam que um cancro é um aglomerado de células que começou a descontrolar-se e a reproduzir-se excessivamente  a uma velocidade elevada! Ingénua e simplisticamente pensaria eu que uma forma de combater a doença poderia passar pela tentativa de controlar e abrandar o ritmo de reprodução.
Pelo contrário, garante João Taborda. Acelerando ainda mais o metabolismo reprodutor das células poder-se-á, com eficácia, provocar não o crescimento, mas o definhar do tumor cancerígeno. E dá como exemplo uma corrida de fórmula 1. Para se ganhar ao adversário e não for prático conseguir abrandar-lhe a marcha... fazer com que ele ande ainda mais depressa pode ser ainda mais eficiente se esse acréscimo de velocidade o levar a despistar-se. Foi com esse objetivo que a sua equipa conseguiu manipular o gene CHK1 adormecendo-do. O referido gene é um moderador do processo de divisão celular permitindo que o processo aconteça num tempo necessário e suficiente para que toda a estrutura celular seja devidamente duplicada para que no final uma célula dê origem a duas idênticas. Curiosamente, esta função quando funciona corretamente, que garante que as células normais não produzem tumores pois a sua divisão é devidamente controlada.  Contudo, quando o processo começa a entrar em ritmo acelerado se, ao invés de o tentar travar, pelo contrário se anular o efeito retardador, o descontrolo resultante faz aumentar o ritmo da divisão celular de tal forma que impede a replicação correta de todas as estruturas celulares originando células inviáveis que não sobrevivem anulando assim o processo tumoral!
 
A alegoria usada pelo investigador é eloquente. Se queremos derrotar um carro de fórmula 1 concorrente e nos é permitido atuar no sistema de travagem, podíamos, é certo, aumentar o atrito dos rolamentos obrigando-o a deslocar-se mais lentamente. Seria uma vantagem competitiva que ele poderia compensar com aumento de potência do motor ou outros argumentos. Mas também podemos, pelo contrário, pura e simplesmente retirar-lhe o sistema de travões deixando que acelere ao máximo e que se despiste na primeira curva a seguir à reta de aceleração!
 
 

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