A opinião de ...

A Sociedade XVI – A vida na Vila, o Escol

Se aqueles eram os afazeres comerciais, também havia as elites profissional e social.
Havia sempre um médico, pelo menos, mas frequentemente mais. Já tinham automóvel. A sua profissão obrigava-os a correr muito caminho e os cavalos já tinham ficado para trás. Os hospitais, pequenos e insuficientes, na maior parte das sedes de concelho, já existiam e aliviavam um pouco a enorme carência das populações, que frequentemente não tinham os meios para os tratamentos recomendados. A mortalidade infantil era imensa e os muitos idosos inválidos vegetavam, à porta das casas, a apanhar sol. O farmacêutico era outra figura de relevo, pela sua arte dos medicamentos, responsável pela sua dispensa em boa ordem.
Assunto mais alegre que o anterior é o do veterinário local. Sabendo da necessidade que os lavradores tinham de socorrer os seus animais e da pesada carga de doenças animais, que também afectam os humanos, o poder central instalou veterinários em todos os concelhos desde o fim do século XIX. Os veterinários eram assim parte do conjunto de notáveis, há quase um século.
Advogados, ou licenciados em direito, havia mais. Muitos nem exerciam, limitavam-se a gerir as suas propriedades, mas havia os notários e os conservadores, indispensáveis nas artes do direito. O juiz estava presente na sua comarca, mas nem todos os concelhos tinham um tribunal.
Na área dos serviços públicos havia ainda outros licenciados ou bacharéis, que exerciam nas repartições de Finanças e nas Câmara Municipais, tribunais e hospitais. Também a autoridade policial tinha o seu papel, nos concelhos em que havia um destacamento maior, assim como o Presidente da Câmara, a autoridade política local. Outros actores políticos, das lides partidárias, ou dirigentes nacionais, estes sistematicamente ausentes, faziam parte deste rol. Vamos ainda acrescentar, por direito próprio, o curador da Misericórdia, o comandante dos Bombeiros e o presidente da Junta.
Finalmente, o Padre, figura omnipresente em todas as famílias e tertúlias. Todos tinham um casamento ou um baptizado a fazer, um funeral ou uma romaria, uma festa de aldeia, o Natal ou a Páscoa. Uma homenagem a estes homens que passavam décadas nas suas paróquias, muitas e muitas vezes com dificuldades financeiras, e que eram o apoio possível, naquelas freguesias mais recônditas, para todos os que tinham alguma dificuldade. Ao longo de muitas décadas, desde o início do século XX, foram certamente milhares de vidas, dedicadas aos outros.
Para além destes notáveis, a que se somavam os comerciantes mais activos, havia muitos outros, licenciados ou não, que se destacavam pelos mais variados atributos, sociais ou profissionais.
Seriam umas 3 ou 4 dezenas de notáveis, nos concelhos de média dimensão. Mas nem todos se davam bem, havia posições e interesses divergentes, concepções antagónicas da vida, da política, da filosofia de vida.
Uma mesa no café onde mais ninguém se sentava, o próprio espaço profissional ou uma das casas privadas eram locais prováveis de reunião onde se debatia a vida, interesses, necessidades, a sociedade ou demais temas sociais. Não poucas vezes se teorizava e debatia a forma de repelir os adversários.
O bairrismo era a cola mais poderosa do mundo. A um não patrício era quase impossível qualquer lugar de prestígio ou poder:
Ele nem sequer é de cá…..

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