A opinião de ...

Um país que corre para o mar

Em 2017, a Ala dos Namorados cantava assim:
“São os loucos de Lisboa que nos fazem duvidar
A terra gira ao contrário
E os rios nascem no mar”.
A verdade é que, a cada dia que passa, de facto, mais os loucos de Lisboa nos fazem duvidar.
Num trabalho da Fundação Francisco Manuel dos Santos (promotora da Pordata, uma base estatística nacional), divulgado pela SIC, demonstrava-se que 80 por cento da população portuguesa habita em 30 por cento dos 308 municípios portugueses.
Gonçalo Matias, presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, dizia que 49 municípios, 15% do total, têm menos de 5 mil habitantes. E apontou o caso de Vimioso, no distrito de Bragança. Mas poderia também ter falado de Alfândega da Fé (4222) ou Freixo de Espada à Cinta (3216). Aliás, dos 12 concelhos do distrito, apenas três (Bragança, Mirandela e Macedo de Cavaleiros) têm mais de dez mil habitantes. Ou seja, 75 por cento dos municípios do Nordeste Transmontano tem menos de dez mil habitantes. A média nacional é de 40 por cento (quatro em cada dez).
“Com exceção de alguns casos pontuais, os únicos municípios que cresceram, em população, nos últimos 20 anos, localizam-se precisamente no litoral.
Em apenas dez anos, 259 dos 308 municípios do continente perderam população, o que equivale a 84%. À conta destas transferências de população, o município de Lisboa tem, atualmente, mais residentes do que todo o Alentejo e Algarve”, disse.
Neste trabalho, a Fundação Francisco Manuel dos Santos aponta essencialmente três fatores que têm levado ao acentuar desta tendência: as transformações económicas, que levaram ao surgimento de mais oportunidades de emprego no litoral, sobretudo no setor dos serviços (turismo) em contraponto com o desinvestimento na agricultura; o desinvestimento na ferrovia e o encerramento de serviços públicos nos territórios do interior, arrastando, com isso, mais população para o litoral (mais não seja, porque os seus postos de trabalho foram sendo transferidos para lá).
Outro dado a reter: “Portugal é dos poucos países da OCDE onde o emprego na administração central representa mais de 80% da totalidade do emprego público (média OCDE – 43%). Este é um indicador de dependência e subordinação ao Estado central.” “Este ciclo de despovoamento é muito difícil de quebrar e tem consequências na economia e até no meio ambiente. Com o abandono de terras agrícolas e florestais verifica-se um aumento do risco de incêndios e degradação ambiental”, alerta.
Para além disso, com menos gente no Interior, perde-se representatividade na Assembleia da República. Bragança já perdeu um deputado (de quatro para três), assim como Portalegre (de três para dois).
Curioso é que, em termos legislativos, Portugal está avançado, com os municípios a terem, por lei, muita autonomia. “Mas, na prática, isso não acontece”, alerta. E vai continuar sem acontecer. E o que dizem os nossos candidatos a deputado?
Em Espanha, 90 por cento da população está muito mais dispersa e distribuída no território.
Ou seja, os loucos estão em Lisboa mas o país ainda corre para o mar...

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