Restaurantes parados, lojas e cafés a meio gás por causa do apagão que pôs muitos a ouvir rádio a pilhas e a acender velas

Sem eletricidade desde o final da manhã e para lá das 23h00 da passada segunda-feira, com a internet em baixo, sem ligações por telemóvel e telefone, foram muitas as lojas do centro histórico de Bragança que optaram por fechar mais cedo no dia do apagão ibérico, que até atingiu algumas regiões de França. A normalidade foi sendo reposta faseadamente nos 12 concelhos do distrito ao longo da noite, mas estar sem luz não é só estar às escuras, é também não poder usar vários equipamentos em casa onde a eletricidade ganha cada vez mais terreno, desde as persianas elétricas, aos eletrométricos, como fogões, fornos, caldeiras que mesmo a gás precisam de eletricidade, computadores, telemóveis que sem carga são inúteis, tal como os computadores.
“Voltei a usar rádio a pilhas, também tenho duas lanternas, uma que carrega a eletricidade, e estava carregada na totalidade, a outra funciona a pilhas. Além disso também tinha velas e o fogão é a gás. Não podia abrir, nem fechar as persianas completamente elétricas, mas tudo se passou com tranquilidade”, contou Maria Custódio residente no concelho de Bragança, que aproveitou a distração dos conteúdos online ou das redes sociais para pôr a leitura em dia.
Se nas casas particulares cada um contornou as dificuldades à sua maneira, no comércio houve prejuízos generalizados. “Nós fechamos às 17h00. Pelas 15h00 veio uma cliente e conseguimos fazer a venda. Depois disso já não conseguimos resolver os pagamentos porque, apesar de o terminal de multibanco ter carga, não tinha ligação à internet. Também não havia clientes na rua preocupados em fazer compras como calçado e roupa. Tinham outras prioridades, como comida”, explicou Tânia Pires, da sapataria Xanca’s.
Na Rua Alexandre Herculano houve até que fechasse os estabelecimentos mais cedo pelas 15h00, ou antes. Mal se soube que o apagão era ibérico e até atingia algumas regiões de França, foram para casa. “Apesar de ser de dia e a loja ter muita luz natural, a partir de certa hora não era possível fazer ligações por telemóvel, nem enviar mensagens, nem fazer pagamentos pelo terminal de multibanco. Decidimos fechar”, acrescentou a comerciante salientando que soube de pessoas que foram comprar rádios a pilhas para estar a par das notícias. “Nós em casa íamos ao carro ouvir rádio para saber as notícias e o ponto da situação” acrescentou.
Se nas grandes superfícies se recorreu a geradores, porque estão preparadas para quebras de energia, não se verificando problemas de maior, os supermercados mais pequenos foram afetados. Por exemplo, o Delícias, na zona da Braguinha, mantém a porta aberta graças a um pequeno gerador, mas com funcionamento mais lento. “Só tínhamos uma caixa aberta, para termos acesso aos preços, e a maioria das luzes estava desligada. A loja estava um pouco às escuras, mas como era de dia conseguia ver-se o suficiente. Tínhamos os mínimos para atender os clientes, embora as máquinas de fatiar fiambre e queijou ou a de cortar pão estivessem desligadas”, descreveu Pedro Serra, da gerência do Delícias.
Neste supermercado-pastelaria remediou-se a situação “como se pôde”, admitiu o responsável e, mesmo sem ter tudo funcional, trabalhou-se. “Não tínhamos máquina de café, por exemplo”, afirmou Pedro Serra admitindo que “foi mais difícil e demorado atender os clientes, porque estava tudo mais condicionado”.
A presidente da Associação, Comercial, Industrial e de Serviços de Bragança (ACISB), indicou que “houve um prejuízo acentuado, dado que os restaurantes estiveram encerrados e com parte do almoço confecionado, mas que na maioria dos casos não pode ser terminado”, explicou Maria João Rodrigues.
Na Padaria Pão de Gimonde regressou-se às contas feitas à mão, mas pelas 16h00 fecharam.
Em Rabal no café Capa Negra também houve prejuízos. “Deixamos de vender muitos cafés, que é o que tem mais saída. Há noite não se fez nada porque ninguém veio. A bebida também foi ficando quente porque o frigorífico estava desligado. Não se estragou nada porque foram só algumas horas, mas os gelados foram derretendo”, explicou Manuel o proprietário que não esconde o espanto com tal corte de luz e não só em Portugal. “Temos que de passar a estar prevenidos”, garantiu.
Na terça-feira de manhã no café Capa Negra em cima do balcão mantinham-se os dois candeeiros petromax usados na noite anterior para alumiar o estabelecimento. Também em Baçal, no Restaurante O Passageiro a terça-feira foi hora de calcular perdas e retomar a normalidade. “Não fiz almoços, porque mesmo com o fogão a gás este só funciona com eletricidade. Tenho umas oito pessoas diárias a almoçar, mais os que aparecem. Alguns gelados perderam a qualidade porque como a arca congeladora esteve muito tempo sem eletricidade foram derretendo. Também não servi cafés, nem finos”, contou Maria Paula, a proprietária.
No Agrupamento de Escolas Miguel Torga as aulas decorreram com normalidade até às 17h00. “Alguns professores que tivessem planeado aulas mais tecnológicas tiveram que se adaptar, mas sem problemas”, garantiu a diretora do estabelecimento de ensino, Fátima Fernandes.
Em Torre de Moncorvo, Deolinda Graça, 96 anos, ficou sem possibilidade de ver as notícias e os programas exibidos durante a tarde na televisão, mas estar às escuras é coisa que não lhe mete medo. Quando era criança não havia luz elétrica na aldeia. “Já estou habituada. Já tinha mais de 30 anos quando instalaram a luz elétrica aqui na aldeia. Por isso, uma parte da vida usei candeias e candeeiros a petróleo, ou velas e para ir à rua usávamos um fachoqueiro de giestas a arder. Agora acendi uma lamparina com azeite, e como tenho duas lâmpadas nas varandas com painel solar a claridade entrava pelas vidraças. O fogão é a gás e o aquecimento a lenha”, descreveu a idosa.
A Câmara de Miranda do Douro na segunda-feira pediu à população para poupar e para usar com cuidado a água da rede pública “face aos constrangimentos” ocorridos a nível Europeu. “Internamente e dentro do Município, informamos que estamos a encetar esforços de maneira a providenciar energia à população.
Informamos que estamos a aguardar contacto dos órgãos governativos, ou da declaração de Estado de Emergência, caso ocorra”, solicitou o município nas redes sociais.